segunda-feira, setembro 19, 2005

“Red Eye”, de Wes Craven

Class.:



“Do i have your attention?” (Charles Keefe)
“Red Eye” é o belo exemplo de um filme cujo realizador mantém um elevado nível de tensão, num asfixiante suspense de abençoados 85 minutos, em que a audiência nem se aperceberá do quão inacreditavelmente estúpido é o argumento. Comparar este filme de Wes Craven a um Alfred Hitchcock pós-11 de Setembro é denegrir o sublime autor de “Rear Window”. Hitchcock era mestre neste género, e alguns dos seus argumentos eram autênticas Obras-Primas, enquanto o argumento deste filme de Craven é um pouco rombo.

Encalhada no aeroporto de Dallas, aguardando o regresso à sua vida atarefada em Miami, Lisa Reisert (Rachel McAdams) inicia uma amena conversa com Jackson Rippner (Cillian Murphy). De forma estranha, acabam sentados lado a lado no avião e Lisa começa a simpatizar com Jackson, sentindo-se tranquila tendo-o por perto. Contudo, a quietude desvanece quando Jackson revela as suas verdadeiras intenções.

O filme inicia como que ludibriando a assistência com um suposto romance de aeroporto, mas quando recordamos o realizador em questão, relembramos que a especialidade de Craven não envolve romantismos… a não ser o beijo afectuoso entre a lâmina de uma faca e a carne tenrinha de um pescoço.
Com a ausência do luxo de múltiplas localizações e personagens, “Red Eye” deixa pouco material para Craven operar. É um filme focado em duas personagens, com muito pouca acção ou desenvolvimento de argumento, mas bem atado por um realizador que encontra a pulsação correcta para provocar ansiedade e desassossego no espectador.
Para “Red Eye” não descambar, necessita de dois actores bem entrosados numa íntima dança com a câmara, dependendo das interpretações para criar tensão em espaços exíguos. Rachel McAdams e Cillian Murphy são sensacionais apesar da árdua tarefa, concretizando a visão de Craven. Ambos injectam nas suas personagens carisma e dinamismo, funcionando como dinamite prestes a explodir. O futuro será risonho para estes dois talentos brutos, que necessitam de ser lapidados.


Murphy revela-se assustador com uma arrepiante naturalidade, numa maldade que afeiçoa, deixando o espectador desejando que ele se redima antes que seja tarde demais. McAdams aparenta ser mais uma cara bonitinha. Aquele permanente sorrisinho estampado na sua cara, fá-la parecer uma versão feminina de Joker, ou alguém que foi exposto durante longas horas a Hélio, o “Gás do Riso”. Mas ela vai crescendo de filme para filme, e em “Red Eye” demonstra toda a sua versatilidade, num papel que contrasta com a comicidade de outro filme que estreou esta semana: “Wedding Crashers”. Talvez Wes Craven seja o responsável pela sua melhoria, pois o competente profissional sempre evidenciou um Toque de Midas com as actrizes. Ele extrai de Rachel McAdams algo que ela nunca manifestou anteriormente.

O filme recorda o thriller de 1995, “Nick of Time”, pela sua tensão claustrofóbica e algumas reminiscências do fabuloso clássico “Wait Until Dark” (1967) de Terence Young. Alguns elementos aparentam ser provenientes de melodramas da década de 50, tais como o reduzido elenco, o compasso de acção, duração comprimida, escassas situações dramáticas e uma intensidade proeminente para disfarçar o argumento obtuso.

Wes Craven explora com “Red Eye” o estado actual das viagens aéreas norte-americanas. A tensão no espectador é elevada, pois são retratadas as ansiedades e agonias dos passageiros contemporâneos. Sustentando-se nos receios relativamente a desconhecidos, na azáfama dos aeroportos, no stress, nos atrasos e nos limitados cubículos, “Red Eye” é claramente um thriller pós 11 de Setembro, avaliando os danos provocados na psique americana.
O medo terá de vir de algum lado e épocas distintas geram fontes distintas para ele ser explorado. O que é interessante observar é como por detrás do óbvio imaginário pós-11/09, se oculta uma subtil metáfora para a invasão particular, reconhecível através da vulnerabilidade feminina.

Wes Craven é um dos mais inteligentes realizadores de filmes série B. Mestre na construção de terror (“Nightmare on Elm Street”) e na respectiva deconstrução (“Scream”), Craven revela-se espontâneo na arte de atiçar os sentidos da audiência. Contudo o último terço de filme descamba numa resolução óbvia e simplória. Depois de muito prometer, o final acaba por comprometer. O argumento tem alguns buracos, mas o ritmo deixa tão pouco tempo para recuperarmos o fôlego, que apenas serão óbvios quando a maioria chegar ao carro e tiver um daqueles momentos «Eh lá!! Espera aí um bocado…». Mas “Red Eye” nunca insulta a plateia, pois Wes Craven foca a intensidade inicial numa apurada técnica, bravura e perícia clássica, satisfazendo quanto baste. Não existem dinossauros, alienígenas, monstros, zombies ou efeitos especiais em catadupa. Apenas dois seres humanos num impetuoso confronto directo. Descalcem os sapatos e apertem os cintos, pois irão estar sujeitos a muita turbulência no ar. Quando aterrarem, serão muitos os olhos ficando vermelhos de raiva.

18 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Andei a tentar evitar ler as críticas antes de ver o filme mas é impossível porque toda a gente fala dele nos blogs! Seja como for, vou tentar ver esta semana. Não espero uma obra-prima mas também acho que não me vou desiludir. Vamos lá ver... Um abraço :)

11:01 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

:)
É um filme que começa tão bem, mas tão bem... que aquele desfecho é inacreditável. Senti alguma raiva, admito.
Abraço!

11:14 da manhã  
Blogger brain-mixer said...

Será que estamos todos enganados sobre Wes Craven? É que ele não parece ser o mestre do "terror" mas sim o mestre do "thriller"... Cada vez mais!

11:36 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Tens razão André Carita, toda a gente fala dele, tenho que ir ver tb :)

11:49 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Hum...também estava com expectativas elevadas para este, mas as críticas que tenho lido não o favorecem muito :|. De qualquer maneira, vou ver esta semana.

Cumps. cinéfilos

12:08 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

Edgar: Sabes... Wes Craven sempre disse que não desejava ser catalogado num só género. Ele lá sabe... Agora que tem talento... lá isso tem. Mas nem sempre o demonstra cabalmente.

membio: Trata-se de uma boa experiência de Cinema, na primeira metade.

s0lo: O último terço é desconexo em relação ao que apresenta nos minutos iniciais. É pena...

12:15 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

vi hoje o filme e fiquei bastante admirado pelo que wes craven consegue fazer em 8m2 de avião. terão uma análise minha em breve. see ya

6:00 da tarde  
Blogger gonn1000 said...

Está na lista de filmes a ver, se calhar vai já esta semana...

6:01 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

André: Também fiquei impressionado com o ambiente no avião.

gonn1000: Felicidades... :)

6:29 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

nossa.. que belo texto hein... fiquei pasma... e claro logo que puder vou ver Red Eye

4:45 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

Não me refiro a Murphy como o Joker, mas a Rachel McAdams pelo seu sorrisinho estampado na face. É uma implicância minha, não ligues... simplesmente irrita-me aquele sorriso que não desaparece, tal como o sorrisinho de Tom Cruise irrita outros tantos.

Murphy é um actor que aprecio imenso, o seu carisma é bem acima da média.

9:50 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

Sim, o duo de actores é excelente e o talento de Craven é aflorado... mas decai imenso acompanhando o aterrar do avião.

11:19 da manhã  
Blogger Carlos M. Reis said...

Vi hoje e deu para entreter.

Sou o único a pensar que a Rachel é igualzinha à Jennifer Garner mas para o mais bonito? Houve certos planos que a cara é igualzinha! Mandem vir as duas e nem se nota que é menage-a-trois!

Abraços Katateh.

10:09 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

Lê a minha crítica ao "Wedding Crashers", que antecedeu esta. Referi o facto da Rachel ser bastante idêntica à Garner. Já somos dois!

Abraço Matateh!

10:40 da manhã  
Blogger Carlos M. Reis said...

Pois, tenho que ver o Wedding Crashers, só hoje ao fazer a minha critica é que a vi no IMDB como uma das principais no filme e logo como a que o Owen Wilson fica doido.

Depois passo pela tua critica para deixar marcas :P

Aquele abraço Katateh!

11:02 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

Porreiro! :)

Aquele forte abraço Matateh!

12:00 da tarde  
Blogger Cataclismo Cerebral said...

Devo confessar que sou um grande fã do Wes Craven há muito tempo. Tudo começou com essa obra de culto que é o Pesadelo em Elm Street. A saga Scream também me interessa, principalmente o primeiro filme, que se diverte a desconstruir as convenções dos filmes de terror. Ora, para mim, este Red Eye começa muito bem. O segmento central do filme (a viagem no avião) está bem construída, com momentos interessantes e empolgantes, dado o espaço confinado em que as personagens se podem mover. Acho que a interpretação da Rachel McAdams está adequada ao espírito do filme e o Cillian Murphy até constrói um interessante vilão (o aspecto do seu rosto também ajuda muito, bem como a cor dos olhos). A química entre ambos funciona bastante bem e os episódios que envolvem outros passageiros estão bem esgalhados. A chatice é que, para "saborear" este filme, temos de esquecer o argumento que o sustenta: será que era necessária toda esta rocambolesca situação para assassinar o congressista? Mas se conseguirmos passar este facto até gostamos da maior parte do filme. O grande problema do filme vem depois, ou seja, tudo aquilo que acontece depois do avião aterrar. Aí Wes descamba, começa-lhe a falhar redondamente a inspiração e sente-se que a parte final vem trair tudo aquilo que até estava a correr bem anteriormente. Parece-me que o realizador quer prestar uma homenagem ao Gritos e ao público desse filme e, assim, o filme lá cai no território do slasher. Sinceramente, dou-lhe 3 estrelas, mas muito por causa do esforço do realizador e do elenco.

Abraço

5:42 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

Estamos quase em total sintonia.

Abraço!

9:27 da manhã  

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