sexta-feira, novembro 03, 2006

Cinzas do Passado



Wong Kar-wai planeia polir um dos filmes que mais o orgulha: a sua Obra-Prima de artes marciais, intitulada “Ashes of Time”. Graças a uma frágil divulgação e com uma débil difusão em DVD, Wong planeia revisitar o filme, restaurando-o e se a Fortissimo Films encontrar comprador, poderemos vir a ter a felicidade de um renovado lançamento no Grande Ecrã.

Ashes of Time” pode não ser o filme mais conhecido de Wong Kar-wai no Ocidente, mas representa uma das suas melhores concepções e foi aquele mais difícil de concluir, excedendo largamente prazos de produção e orçamento previsto, vindo a ser terminado apenas ao fim de dois anos de rodagem. Aquando do lançamento do seu épico de artes marciais, o resultado foi um retumbante fracasso de bilheteira. O insucesso é a consequência natural para um filme que se demarca ligeiramente do frenesim da tradição wuxia. Todavia, “Ashes of Time” não representa apenas um dos melhores filmes de Wong (senão o melhor), como também um dos melhores filmes de sempre. O único entrave é justamente a sua fraca divulgação ocidental. É um filme de autor, pleno de meditações interiores. É uma opulência poético-narrativa que mescla três contos de Amor, Vingança e Redenção, numa fusão de histórias que revolvem um filme de acção sobre inacção, sobre espadachins prodigiosos consumidos pela reminiscência de amores transviados. É aquele recomeçar do zero que Wong pincela na consequência do fracasso que as suas personagens experimentam, como se o mundo não fosse o lar de nenhuma delas - com destaque para a sublime existência metafórica do vinho que suprime memórias. A estrutura é densa e o jogo de flashbacks com a linha temporal demanda revisionamentos enriquecedores. Envolto numa neblina onírica, Wong recebe o olhar elegíaco do seu colaborador e magno director de fotografia em actividade: Christopher Doyle, que arrecadou com este filme o galardão de Melhor Fotografia em Veneza. A sua técnica glorifica a cor e a luz, ampliando o enlevo que o filme ministra e numa das derradeiras imagens, um singelo plano de Maggie Cheung contemplando os eventos decorridos, aconchegam-na numa aura angelical.
O que é Cinema? Sucintamente, apetece dizer: Cinema é Wong Kar-wai… Cinema é “Ashes of Time”.

8 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Concordo em absoluto com a última linha do teu post, caro Francisco, no entanto acrescentava um outro sublime realizador de imagens em poesia: Yimou Zhang.

12:46 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

Ou Hou Hsiao-Hsien...
Mas Wong Kar-wai é insuperável na minha humilde consideração e contemplação.

1:14 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Concordo que Kar-wai é mais versátil nos temas que Zhang. Já Hou Hsiao-Hsien desconheço... terei de o descobrir.

1:21 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

Nesse caso, aconselho-te vivamente a descoberta do universo de Hou Hsiao-hsien.

2:19 da tarde  
Blogger Loot said...

Wong Kar-Way é um realizador fantástico, uma pena que alguns filmes não tenham uma maior exposição, como é o caso deste que infelizmente ainda não vi e depois de ler o teu texto mal posso esperar para o fazer. Dele vi apenas o chunkgin express, o disponivel para amar e o 2046, adorei todos.

5:35 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

Fica então combinado: quando vires este "Ashes of Time" diz-me o que pensas do mesmo.

5:44 da tarde  
Blogger Mayra said...

Eu sou uma grande fã dos filmes de Wong Kar Wai. In the mood for love é um dos grandes filmes da minha vida. No entanto, tenho acompanhado seus trabalhos e sinto uma mudança de linguagem e de direção. Não sei dizer ao certo se seria uma mudança, ou talvez um encontro tão grande de uma forma, que a faça cristalizar-se, perdendo uma dinâmica mais construtiva e transformando-a em fórmula. Tenho a impressão que "2046" e "Blueberry nights" não tem o vigor de "Fallen angels", "Chuncking Express" e "Days os being wild".

Caí neste blog completamente por acaso quando buscava coisas acerca do filme (Ashes of time) que acabei de ver na mostra internacional de cinema de São Paulo, mas aproveitando a oportunidade, gostaria de saber da opinião dos participantes desta conversa a respeito.

um abraço!

12:39 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

Pois eu admiro o rumo que ele deseja seguir... torna-se imprevisível.

Abraço!

11:25 da manhã  

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