quarta-feira, fevereiro 28, 2007

"The Host", de Bong Joon-ho

Class.:



A profundidade que o Entretenimento pode hospedar

Um dos filmes mais aclamados do ano festivaleiro transacto, chegou finalmente a Portugal via Fantasporto. “The Host”, o mais recente filme do sul-coreano Bong Joon-ho é uma fusão compacta de drama familiar, comédia, horror, ficção científica e sátira política. Aconchegado num embrulho de monster movie, o filme apresenta uma criatura mutante que emerge do rio Han, semeando o pânico com uma voracidade indomável por carne humana. Uma das suas vítimas é Hyun-seo, filha de Gang-du, que é arrastada pela criatura e desaparece. Como resultado do ataque do ser monstruoso, sua família tomba numa profunda agonia pela sua perda, à medida que são aprisionados em quarentena juntamente com os residentes da cidade, pois as autoridades proclamam que o monstro espalha um vírus mortal. Quando menos espera, Gang-du recebe uma luz de esperança sobre a sobrevivência da filha e juntamente com seus familiares decide embarcar numa missão de salvamento… sendo que para tal, terão de escapar à quarentena imposta.



The Host” hospeda uma premissa esgotada e emana algo completamente inesperado em profundidade e entretenimento. Ignorando completamente mecanismos como o de “Jaws”, que mantém o monstro oculto até um determinado momento, Bong Joon-ho pavoneia sua besta logo nos momentos iniciais, em plena luz do dia, numa marcha de pura visceralidade. Sinceramente, considero esta invasão inicial absolutamente Perfeita em execução, numa consistente amálgama de suspense, empolgamento e humor negro. Apesar do final revelar lampejos das limitações orçamentais, a concepção do vilão é realística e seus sustos bastante eficazes. Mas o coração da história é a exposição de laços de amor e responsabilidade familiar. Apesar das constrições do género, Bong evita com mestria as ratoeiras que poderiam aniquilar suas sensibilidades. Não existem heróis vangloriosos, nem super-poderes individuais que embarcam numa jornada solitária contra a besta. Tudo gira em torno da aliança de uma família comum, buscando o poder incomum que pulsa no seu âmago, quando paira uma aura de fatalidade no seio da sua união. Sentimos suas amarguras e suas frustrações e a luta interna que travam para se manterem unidos é mais intensa que certos ataques do mutante. Toda uma panóplia de metáforas pode ser retirada deste filme e todos poderemos apreender algo sobre as preocupações sócio-políticas de um país (Coreia do Sul). Existe uma crítica à influência americana na cultura oriental, à constante interferência dos Estados Unidos nos assuntos nacionais (e porque não globais?), pois quando a aberração emerge, surgem logo forças americanas com a utilização do caos para instituir a lei marcial, com o intuito de aniquilar em solo forasteiro um monstro da sua criação. O hospedeiro (“Host” do título) poderá muito bem ser a própria Coreia do Sul, que ao alojar militares americanos poderá fervilhar abominação sob a superfície da sociedade coreana. As referências de injustiça ambiental são inclusivamente intemporais, pois na utilização do químico Agente Amarelo, existe uma alusão ao Agente Laranja espalhado na Guerra do Vietnam. A abrangência da crítica foca ainda a inaptidão do governo em asseverar direitos humanos para todos os seus cidadãos, desde uma alimentação básica, abrigo, emprego e segurança. “The Host” é um dos filmes mais divertidos dos últimos anos, edificado por um dos mais inteligentes cineastas orientais, Bong Joon-ho, autor do brilhante “Memories of Murder”. Além dos sustos da praxe existe comédia negra bem potente, cortesia de um elenco impecável e de um argumento perspicaz, que na sua densa componente humana eleva factores burlescos e trágicos. “The Host” deveria ser estudado por todos aqueles que desejam seguir pegadas de entretenimento com substanciais histórias originais que transcendem géneros.

7 Comments:

Blogger PintoRibeiro said...

Apontei, mais uma vez. Abraço.

9:51 da manhã  
Blogger RPM said...

amigo!

isso é que é uma vida de Fanta's!

Um abraço

RPM

3:44 da tarde  
Blogger Sérgio Lopes said...

Perfeitamente de acordo Francisco. Abraço.

9:14 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Um filme muitíssimo interessante em vários aspectos, sem dúvida das melhores descobertas que fiz no Fantas (onde fui pela 1ª vez este ano). Talvez escreva umas linhas sobre ele também nos próximos dias ;)

11:51 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

PR: Bom dia. Abraço!

Rui: E que bela vida!

Abraço!

Sérgio: Bong continua a surpreender-me com seu intelecto bem apurado.

Abraço!

Helena: Ora muito bem-vinda a este maravilhoso Festival. :)

8:20 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Grandes apontamentos tecnicos, fantastico cast e a excelente mistura de generos com destaque para o peculiar sentido de humor (ja demonstrado no "barking dogs")fazem deste The Host um autêntico carrossel de emoções!
O maior pecado foi mesmo a falta de protagonismo da maravilhosa Bae Doona. Bong com o terceiro grande filme, mas ainda assim, a sua obra-prima continua a ser o Memories!

abraço!

1:47 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

A minha estima por "Memories of Murder" é igualmente elevada. Sublime!

8:32 da manhã  

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