sexta-feira, março 02, 2007

Shi gan



Quando deambulamos pela vida fracturados emocionalmente, cada ser em nosso redor pode significar um amor perdido. Existe um arco cismático, um devaneio de sofreguidão por um desejo perene que julgamos merecer. “Time”, do sul-coreano Kim Ki-duk procura analisar essa fragilidade (física e emocional) que nos distingue enquanto humanos. Conciliando sensibilidade e um senso de humor atípico, orienta reflexões e desorienta perspectivas convencionais dos fenómenos sociais que pretende esquadrinhar. Kim Ki-duk escava na paranóia etária e expande seu interesse no histórico de mortificação do corpo feminino, retratando-o como objecto de desejo problemático em “Samaritan Girl” e “Bad Guy” sob a forma de prostituição, e em “Time” sob a epidemia da cirurgia plástica. Manipulando a linha esguia que separa ética de estética, até a falta de consistência de certas cenas dramáticas paradoxalmente acentuam o impacto das mesmas, pois o foco da lanterna temática é orientado para uma violência metafísica na busca pela identidade. Perante a caminhada do tempo, perante mutações cruéis e adversidades sofridas, destaca-se o nosso carácter efémero perante a erosão emocional que nos coíbe de seguir adiante. As personagens recorrem de forma cíclica a um bosque insular de esculturas e na forma como atentam a intensidade das obras expostas, apreendemos que a atracção do local reside no significado da Arte semeada: a constância diante da transição das estações. O ritmo elíptico do filme reforça o colapso metafórico do tempo, da humanidade, dos corpos e dos sentimentos. A identidade é minguada pelo rito sociológico mundano, por máscaras cosméticas que o ser humano busca desesperadamente para injectar vitalidade num amor moribundo, numa paixão intensa que esvaeceu ao longo do tempo, numa afeição que deixou de ser valorizada por espíritos que se comportam como um vírus quando deixa de sentir paladar e utilidade no que sorveu durante um período. “Time” é a observação amargurada de uma geração perdida, emaranhada nas teias de uma cultura orientada para uma juventude de vaidades, excessos e afastamento das virtudes imateriais e incorpóreas que poderão ascender nossas existências.

13 Comments:

Blogger RPM said...

ora bolas....

não sei se há outras marcas para além de Fanta's....

mas, que tal um Kia????

estás mesmo um asiático, amigo Francisco, mas muito ligado à Península da Coreia....

abraço FRancisco e bom fim de semana com a Ninfa...Aproveita e vai à Nova Zelândia....llolol

RPM

9:31 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

:)

Na Coreia residem vários cineastas da minha predilecção. Kim Ki-duk é um deles.

Abraço!

9:50 da manhã  
Blogger Nuno said...

"Quando deambulamos pela vida fracturados emocionalmente, cada ser em nosso redor pode significar um amor perdido."

Só por esta frase...

11:06 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

É a expressão de um sentimento que aflige muitos de nós em determinadas etapas.

11:53 da manhã  
Blogger Gonçalo Trindade said...

É nestes momentos que tenho pena de não viver no Porto... enfim, talvez faça uma visita ao Fantas no próximo ano. Por agora, mal posso esperar pelo lançamento nacional da nova obra de Kim Ki-duk. É tão bom ver que o cinema coreano está a crescer.

Mas o que eu quero mesmo é ver a tua análise ao "The Fountain". Vi o filme há pouco tempo atrás (é uma obra-prima), e estou extremamente curioso para saber a tua opinião.

12:02 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Ainda não arrumei as ideias quanto a este filme, nem sei se conseguirei fazê-lo. A expectativa com que o fui ver saiu um pouco desapontada mas ainda assim é uma obra que levanta questões muito interessantes sobre a identidade e a sua relação com o amor dos outros e o amor-próprio. Um filme um tanto ou quanto perturbador...

12:56 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

Gonçalo: Vou vê-lo hoje, na sessão de encerramento do FANTAS.

Helena: Qualquer obra do Kim é inquietante. O segredo é eliminar expectativas. É o que aprendi ao longo dos tempos/visionamentos. Cada filme tem a sua divina particularidade e é nessa realidade que nos deveremos atracar.

1:41 da tarde  
Blogger Gonçalo Trindade said...

E chegaste a ler o (magnífico, mas não tão bom como o filme) comic, do Kent Williams?

2:17 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

Sim, claro.
Estou ansioso pela projecção do filme (logo à noite), para constatar a visão cinematográfica delineada por Aronofsky.

2:35 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Belo texto! Não é o seu melhor filme, ainda assim não deixa de ser (mais) uma intrigante visão de um autor genial que é Ki duk! Aquele último terço do filme é particularmente desconcertante e ao seu melhor estilo!

abraço!

9:23 da tarde  
Blogger Francisco Mendes said...

Maravilhosamente inquietante.

Abraço!

9:05 da manhã  
Blogger C. said...

Gostei muito deste... estou a ver que nos "encontrámos" muitas vezes ;)

3:11 da manhã  
Blogger Francisco Mendes said...

Creio que sim. Várias vezes. :)

9:16 da manhã  

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